Mãe de Maisla se desespera ao chegar no local onde o corpo foi achado e é contida pelos populares Anderson Barbosa - Sara Vasconcelos
Até que ponto o homem é capaz de cometer atrocidades contra seu semelhante? Existe limite para a barbárie humana? É triste admitir, mas a crueldade parece não ter fronteiras para uma mente doentia, e as respostas para essas indagações, infelizmente, não estão a um breve alcance. O corpo de uma criança esquartejada, encontrado na manhã de ontem em um terreno baldio da Avenida Tomaz Landim, na zona Norte da cidade, que a família acredita ser da pequena Maisla Mariano Santos de Moura, de apenas 11 anos de idade, prova o que nossa sociedade já sabe e entra para o lamentável rol dos crimes mais brutais do Estado. Em um saco de açúcar, havia um tronco e metade de uma perna. A cabeça, a outra perna e os braços, até o fechamento desta edição, não haviam sido achados.
Maisla foi vista pela última vez por volta do meio-dia dessa terça-feira, empurrando sua bicicleta cor de rosa pela rua Carlos Cosmos, perto de casa (rua Aluízio Alves, em Jardim Lola). Ela havia acabado de deixar o almoço do pai, Nerivan Pereira dos Santos, na banca de relógios onde trabalha, também nas proximidades. Daí em diante, sua mãe, Marisa Mariano de Moura dos Santos, que a aguardava em casa para almoçar, não a viu mais.
A partir daí, a família entrou em desespero. Começou uma série de ligações para as polícias Militar e Civil, Corpo de Bombeiros e SAMU. Os pais também saíram em busca da filha, procurando informações junto aos postos de saúde da zona Norte e hospitais da capital. Ninguém sabia notícias de Maisla.
A repercussão do crime foi destaque em vários programas na rede nacional de televisão e confirma, cada vez mais, a que ponto de insegurança vive a sociedade potiguar.
Suspeito teria prometido se vingar
Por volta das 2 horas da manhã de ontem, após já terem encontrado a bicicleta de Maisla abandonada próximo a uma viela, na avenida Tomaz Landim, seis policiais militares foram ao local. Em uma das casas da pequena vila, também a poucos metros de onde, horas depois as partes do corpo da criança seriam encontradas, o residente, um homem de 55 anos (que o JH PRIMEIRA EDIÇÃO prefere não identificar até que seja comprovada sua culpa), passou a ser apontado pelos familiares de Maisla como principal suspeito do desaparecimento da menina e, consequentemente, de tê-la matado.
Apesar de os policias não terem encontrado nada na casa que incriminasse o indivíduo , o homem foi levado à Delegacia de Plantão da zona Norte para esclarecimentos. Mas, não havendo provas sobre sua participação no sumiço de Maisla, e uma vez que o desaparecimento da garota não havia completado 24 horas, ele foi liberado.
Segundo uma das tias de Maisla, Ângela Maria Mariano da Silva (42), a busca na casa do vendedor de biquínis se deu porque o mesmo já teria ameaçado se vingar da menina. "Esse homem também ia à mesma igreja que nós frequentamos (Igreja Adventista do 7º Dia). Mas num certo dia, minha sobrinha chegou em casa dizendo que ele (o suspeito) tinha tentado abusar sexualmente dela e de outras crianças. Nós o denunciamos ao pastor da época (em 2006) e ele acabou expulso dos cultos. E, para falar a verdade, desde essa época que nós ouvimos essa história que ele teria dito que se vingaria dela", afirmou a tia.
A reportagem também ouviu o atual pastor da Igreja. Fernando Silvano admitiu que o acusado foi expulso das atividades religiosas e dos cultos por causa das queixas sobre seu comportamento. "A história é essa, mas somente agora fiquei sabendo disso. Como somente assumi a missão no ano passado, nunca cheguei nem a conversar com ele ou aconselhá-lo. Até porque ele não era um frequentador assíduo. Vez ou outra aparecia", afirmou.
Uma vizinha da casa de Maisla, que preferiu não se identificar, também confirmou a versão e acrescentou: "Depois do que aconteceu, ficamos sabendo que ele já teria fugido de Rondônia, onde tentou estuprar duas crianças. E que também tinha o costume de levar meninas em sua casa, pra provar biquínis".
Para o delegado da 9º Distrito Policial, em Panatis, que há quase três anos é o responsável pelas investigações na região, "esse é certamente o crime mais brutal que Natal já viu. Não me recordo de ter visto uma criança assim, esquartejada dese jeito", admitiu.
Itep ainda não confirma se corpo é de Maisla
Embora a mãe, Marisa dos Santos, tenha confirmado que o tronco e a metade de uma perna encontrados no matagal da avenida Tomaz Landim, dentro de um saco, sejam de sua filha, apenas pelo short preto - similar ao que Maisla usava quando desapareceu - não é possível afirmar que se trata da filha dela. Para os peritos do Itep, é preciso que a cabeça da menina também seja encontrada para se confirmar a suspeita.
Por telefone, o atendente do necrotério do Itep, Felipe Barela, explicou que, caso as outras partes da criança não sejam encontradas até a manhã desta quinta-feira, a mãe de Maisla será chamada para que sejam colhidos materiais destinados ao exame de DNA. "Só assim teremos certeza da identidade do corpo encontrado", disse. Questionado sobre quanto tempo leva para se ter um resultado definitivo, Felipe afirmou que o resultado deverá ficar pronto em 60 dias, já que a análise será feita em Salvador (BA).
Vale registrar que o laboratório de análises 'DNA Center', aqui em Natal, realiza o mesmo procedimento. Por R$ 1.200,00, o resultado do exame pode ser conhecido em pouco mais de 24 horas.
Festa de aniversário seria amanhã
As lancheirinhas, os copos e pratos descartáveis já estavam comprados. Os doces e os refrigerantes, encomendados. Seus amiguinhos foram convidados, mas, muito provavelmente, não haverá mais festa. A menina Maisla Mariano Santos de Moura, que no último dia 5 completou 11 anos de vida, comemoraria amanhã seu aniversário. "Não fizemos antes porque era um dia de semana. Depois veio o Dia das Mães. Por isso, seria na sexta", revelou Nerivan dos Santos.
O pai da menina, que não se alimenta desde o desaparecimento da filha, se esforçou para conversar com a reportagem. Aparentemente sob efeitos de tranquilizantes, falou pouco. "Tudo que eu quero é justiça. Agora sei a dor que os pais daquela menina (Maria Luiza Fernandes, de 15 anos, assassinada dia 21 de abril) estão sentindo. Não sei se voltarei à igreja. Sei que isso mexeu muito com minha fé", desabafa.
Já a mãe da garota, Marisa dos Santos, que passou praticamente toda a tarde de ontem no Instituto Técnico Científico de Polícia (Itep) para tentar reconhecer as partes do corpo que foram encontradas, chegou à sua casa ainda em estado de choque e preferiu não falar com a imprensa.
Ao redor da humilde moradia, apenas o clima de revolta e indignação. No ar, a certeza da dor e de que naquela casa, dificilmente, alguém cantará parabéns novamente.
“Não adianta pôr em manicômio. O ideal é trancar na cadeia e jogar as chaves fora”
Duas barbáries em um curto espaço de tempo. Cerca de 20 dias separam os crimes envolvendo as meninas Maria Luiza Fernandes Bezerra, 15 anos - encontrada morta com ruptura de útero -, e Maisla Mariano Santos de Moura, 11 anos - desaparecida desde a última terça-feira e que familiares suspeitam que seja dela, o corpo esquartejado encontrado na manhã de ontem, em um terreno baldio, em Igapó. Os dois casos chocam pelos requintes de crueldade. O que leva alguém a esquartejar uma criança, embalar os pedaços do corpo em sacos e ocultá-los, separadamente? A falta de justificativas para tamanha monstruosidade torna repetitiva a indagação.
No entanto, sob a ótica da psicanálise, dois desvios de personalidades são observados: perversão ou surto psicótico podem ser causas dos crimes. Segundo a psicanalista da Escola Brasileira de Psicanálise, Ruth Dantas, não há como traçar um perfil psicológico de quem comete essas atrocidades. Em geral, são pessoas tidas como "acima de qualquer suspeita", que mantém uma vida social normal e trazem em seus históricos de vida, graves falhas na estruturação psíquica, podendo ser originadas na falta de referencial da função paterna durante a infância, relação familiar desestruturada, situações adversas, miséria e heranças com distúrbios mentais.
"O conjunto de possíveis fatores não isenta a responsabilidade do sujeito. Nem todo mundo que passa por estes problemas saem por aí matando ou estuprando", afirma a psicanalista.
A diversidade de distúrbios da sexualidade pode se manifestar em casos de pedofilia e sadismo - o que caracteriza o distúrbio psicológico de perversão. Neste caso, salienta a especialista, não há cura, nem tampouco tratamento terapêutico ou uso de medicamentos capazes de modificar o quadro. "Com certeza são pessoas sádicas, que extraem dos requintes de crueldade o seu prazer. Não adianta colocar em manicômio psiquiátrico. O ideal é trancar na cadeia e jogar a chave fora", frisa. Os pedófilos, segundo ela, observam na criança um puro objeto que podem usar, já que o nível de perturbação não os permite a atração por parceiros da mesma faixa etária. Apenas os casos de psicopatia, podem ter um controle por meio de tratamento psicológico.
Fonte: O Jornal de Hoje