sexta-feira, 5 de dezembro de 2008

Pastor adventista conta horror vivido em Santa Catarina

Caminhão da ADRA leva mantimentos a Blumenau

Blumenau, SC... [ASN] Fábio Roberto Correa, pastor das igrejas adventistas de Blumenau, em Santa Catarina, conta o que viveu a partir do dia 22 de novembro, com as chuvas que inundaram várias cidades catarinenses, desabrigaram milhares e mataram dezenas de pessoas. Leia o emocionante relato do pastor.

“22 de novembro de 2008 era para ser um sábado normal, não fosse o excesso de chuvas que caía em volume nunca visto durante os 3 últimos meses e a realização da Caravana da Esperança em Blumenau, pelo pastor Neumoel Stina, que pregava enquanto a chuva caia fortemente nos pátios na Vila Germânica, em Blumenau.

“Choveu o dia todo e a noite toda. Quando amanheceu o dia 23, fui acordado por minha esposa que me mostrou o rio que corre atrás do nosso prédio. Ele estava cheio e quase chegava no quintal do condomínio: 8,5 metros, enchente em Blumenau. Tiramos o carro da garagem e levamos a um morro próximo. Fui à padaria e fiquei assustado. Não havia luz, nem pão. Uma fila enorme. Um desastre iminente? Corri para a igreja e me juntei a dois diáconos para juntos salvarmos os móveis e utensílios das partes de baixo da igreja.

“A água cobria a calçada enquanto uma canoa era levada pela correnteza. Às 11h um amigo chegou machucado com suspeita de fratura em ambos os pés, um motoqueiro o levou ao hospital. Na igreja nosso almoço foi 3 pacotes de bolacha recheada que pegamos do Mutirão do Natal. Pouco tempo depois o telefone toca e uma voz assustada dizia que iria abandonar o prédio, pois todas as casas em frente dele estavam caindo, que horror! O rio já estava em 10 metros.

“Saí da igreja de caiaque e atravessei a alameda com água pela cintura. Quando entrei na rua Hermann Huscher presenciei uma cena que nunca tinha visto na vida. As casas pareciam de papelão e os morros derretiam como sorvete sob o sol de primavera. Pessoas gritavam, outras choravam. Minha esposa saia entre a lama, abraçada e chorando com uma amiga. O vizinho trazia minha filha no colo, assustada sem entender o que estava acontecendo. Um primo nos deu abrigo, comida e cama. Começava uma semana que marcaria a vida de todos nós.

“Tinha 10 anos quando ocorreram as terríveis enchentes de 1983 e 84, não me lembro de muita coisa, mas desta vez nós estávamos completamente envolvidos. Desde a menina de 3 anos que morreu soterrada na Rua Araranguá, no primeiro dia da enchente, até a família de 4 pessoas que foi soterrada nesta sexta-feira, no já famoso morro do Baú. Tudo isso mexeu conosco. Vizinhos perderam as casas, amigos e irmãos perderam tudo, uma vida, um sonho.

“No rosto dos blumenauenses um misto de angústia, medo, dor, perdas, mas principalmente solidariedade. A tragédia uniu a todos, seja no prédio, na rua ou na igreja. Não importava a cor da pele, a posição social, a religião. Todos arregaçaram as mangas e se puseram a trabalhar para minorar a dor dos flagelados: seja socorrendo um vizinho, limpando casas, fazendo comida, levando mantimentos, ou orando. Todos irmanados com uma força colossal e com uma esperança titânica. Vamos recomeçar, vamos construir tudo de novo.

“No meio da semana a ADRA e sua valorosa equipe começava a trabalhar, o primeiro caminhão abarrotado de mantimentos chegava de Florianópolis. De todos os cantos de Blumenau, os irmãos vinham buscar comida, água e roupa para seus vizinhos, parentes e amigos. Nunca vi tanto desprendimento e caridade. Ontem mais dois caminhões, um de pessoas que nem conhecemos lá de Bom Retiro e Alfredo Wagner. É o Brasil unido por Santa Catarina.

“Na semana da Caravana da Esperança, o que mais se fala é de esperança, esperança, esperança. Onde está a esperança? Quem sabe a resposta esteja na calamidade, nos desbarrancamentos, no morro! Foi isso que se viu neste final de semana trágico. No bairro Garcia houve um grande desbarrancamento num morro, a lama correu e as árvores caíram, mas as que ficaram formaram algo que nos chama a atenção: uma cruz.

“Uma cruz? Sim uma cruz. Elevo os meus olhos para os montes. De onde me virá o socorro? O meu socorro vem do Senhor que fez os céus e a terra. No ano do Impacto Esperança a cruz está lá como um lembrete para os blumenauenses e para o mundo de que na cruz há esperança. Esperança para reconstruir tudo de novo, esperança de dias melhores, de dias de sol. Esperança de um novo amanhã, não aqui, mas na Pátria além.

“29 de novembro de 2008, mais um sábado chegou, era para ser diferente, mas aqui estamos nesse teatro com nossos líderes que vieram para nos trazer uma palavra de conforto, de amor, de fé e, principalmente, esperança.” [Equipe ASN - Fabio Roberto Correa]